Hoje é:19 de setembro de 2024

Tecnologia a serviço da natureza

Conheça o Instituto de Tecnologia da Amazônia, projeto do cientista Carlos Nobre por uma Amazônia mais sustentável

Por Carlos Cruz

Inspirado no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês), um novo centro de pesquisa concebido por um cientista brasileiro traz uma ideia inovadora para uma Amazônia mais sustentável. O Instituto de Tecnologia da Amazônia (AmIT, na sigla também em inglês) é um projeto idealizado por Carlos Nobre, professor e cientista da Universidade de São Paulo, em conjunto com Maritta Koch-Weser, professora e presidente da ONG Earth3000 e Adalberto Val, professor e pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA).

A principal proposta do AmIT é desenvolver tecnologias sustentáveis, a partir da premissa de que “o conhecimento da Amazônia deve ser fundamentado na ciência e na tecnologia direcionadas à inovação para garantir a inclusão socioeconômica no desenvolvimento da própria região, observando os preceitos fundamentais da conservação ambiental”.

A ideia nasceu a partir de um incômodo dos pesquisadores ao perceberem que os estudos produzidos demoravam para resultar em tecnologias sustentáveis. “O que a gente está querendo é acelerar esse processo”, conta Val. “Isso começa a nascer a partir de alguns anos atrás, para que a gente pudesse dar vazão a esse conhecimento todo que vem sendo produzido sobre a região, sobre a Amazônia”, completa. Segundo o pesquisador, o conhecimento produzido era pouco utilizado, enquanto a Amazônia continua sendo destruída pelo desmatamento e pela mineração ilegal, entre outras questões.

Como acontecerá o desenvolvimento tecnológico?

Val aponta dois caminhos que devem ser trilhados para que esse desenvolvimento tecnológico aconteça. O primeiro é colecionando todas as informações já produzidas no Brasil e nos demais países amazônicos (Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Guiana, Guiana Francesa, Suriname e Venezuela), além de estudos realizados em outros países pelo mundo. O segundo caminho é produzir novas tecnologias, viabilizando a conservação ambiental, a inclusão social e a geração de renda. “Quando a gente está falando isso, nós estamos falando em desenvolvimento de tecnologias de altíssimo nível, não é uma coisa convencional. A gente quer desenvolver novas tecnologias, mas de altíssimo nível”, explica o pesquisador.

A intenção do instituto é trabalhar, não apenas com o Brasil, mas envolver toda região Pan-Amazônica, trabalhando todo o bioma para que se tenha uma real conservação ambiental. “Ela [a conservação] deverá envolver todos os países amazônicos e deverá ocorrer em todos os estados amazônicos brasileiros. Então ninguém vai ficar para trás, porque nós não podemos pensar o bioma amazônico de forma fragmentada. Nós precisamos pensar o bioma amazônico como uma região toda, integral. Particularmente para o Brasil, por exemplo, se você pegar os grandes rios amazônicos que entram no território brasileiro, eles têm as nascentes nos outros países”, esclarece.

Outro ponto importante do projeto é que a população da região não é colocada em segundo plano. De acordo com o pesquisador, a interação com os moradores será uma prioridade, já que são eles que usarão a tecnologia. “Muitas vezes, a gente já tem o pessoal trabalhando em alguns produtos da Amazônia, como é o caso, por exemplo, do açaí, como é o caso do Pirarucu, que é o peixe que tem aqui na região, como é o caso do cacau. Nós precisamos entender quais são os gargalos na visão deste pessoal que está trabalhando nos processos de produção para que a gente possa ajudar. E a ideia quando a gente está falando ‘possa ajudar’, é a gente trazer esse pessoal para poder fazer parte da solução”, pontua.

Ao todo, cinco principais eixos serão trabalhados pelo instituto: Águas da Amazônia, Floresta, Paisagens alteradas, Amazônia urbana e Mineração inteligente. Perpassando esses tópicos, existem ainda nove componentes prioritários:

  1. Saúde integral e medicina tropical;
  2. Economias e materiais sustentáveis;
  3. Manufatura distribuída;
  4. Tecnologia para paisagens alteradas;
  5. Modelos educacionais;
  6. Recrutamento de pessoal;
  7. Outreach (prestação de serviços);
  8. Negócios e economia suportada por CTI;
  9. Direitos do bioma amazônico.

Cada componente é considerado a partir dos eixos. “Então, quando eu tiver um problema de saúde para ser tratado, ele será tratado nos cinco centros, para produção de uma tecnologia sustentável, que vai ser socializada rapidamente”, destaca o pesquisador. Segundo Val, esse tipo de trabalho diferencia o instituto do que é feito em universidades e outras instituições de pesquisa.

Cooperação público-privada

Para que o projeto saia do papel, tanto a contribuição pública quanto a privada serão necessárias. Val explica que o instituto conta com aportes do governo brasileiros e de outros países, ao mesmo tempo que irá interagir com a iniciativa privada. “A gente já interagiu com alguns outros governos, já interagimos também com o IMT, lá nos Estados Unidos, de tal forma que o que nós estamos esperando agora é concluir o projeto do instituto e levantar os recursos necessários pra gente poder avançar”, comenta Val sem esconder o entusiasmo. Entre os doadores para o projeto, estão as fundações MOOR e Arapiaú.

Para Val, a natureza público-privada é importante para interagir com instituições de toda a Pan-Amazônia, de forma que não haverá somente fomento a pesquisas em desenvolvimento, mas também será possível desenvolver pesquisas em conjunto com outras instituições, alavancando o processo de produção de tecnologias sustentáveis rapidamente.

Próximos passos

Em 2021, o pré-estudo de viabilidade do instituto ficou completamente pronto. Em 2022, o estudo de viabilidade e o projeto começaram a ser trabalhados. O projeto ainda inclui cinco laboratórios flutuantes que terão o Rio Amazonas como artéria de desenvolvimento, interagindo com as comunidades do entorno. Além disso, são os flutuantes que irão interagir com os centros de conhecimento geral (um deles localizado em Manaus/AM) e os centros de conhecimento regionais espalhados por outros estados e países amazônicos.

Mas é só neste ano de 2023 que o projeto começará a ganhar forma. “A gente definiu os componentes, definiu os centros, definiu os custos, definiu a rotina de como será o funcionamento. Agora nós vamos dar vida a isso. Nós vamos produzir o projeto que vai dar vida a esse instituto. E ele vai estar funcional até o ano 2030. Esse ano de 2023 a gente terá o projeto e já terá as primeiras prospecções de levantamento de recursos para o desenvolvimento do projeto”, conclui.

Carlos Cruz é jornalista na Anicer.

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