Hoje é:10 de novembro de 2024

A história do piso de caquinhos de cerâmica vermelha

O revestimento queridinho dos subúrbios paulistanos na década de 50 e que ficou até hoje na memória afetiva

Por Juliana Meneses sob supervisão de Manu Souza | Imagems: Victor Heringer/Arquigrafia e Evandro/A Vida Numa Goa (http://avidanumagoa.blogspot.com/)

Não tem quem nunca tenha visto o tradicional piso de caquinhos cerâmicos, muito utilizados nos bairros do subúrbio de São Paulo, mas também vistos em outros estados país afora, majoritariamente vermelho, mas com algumas variações de amarelo, preto e branco, a história por trás desse piso foi estudada pelo engenheiro e professor, Manoel Henrique Campos Botelho, que publicou inclusive um artigo sobre o tema, um de seus textos mais famosos.

Anúncio da Cerâmica São Caetano.

De acordo com as pesquisas do professor, nas décadas de 40 e 50, a famosa fábrica Cerâmica São Caetano, localizada na região do ABC Paulista, era uma das principais no setor, seu carro-chefe eram as placas quadradas de 20×20 muito populares e com valor acessível. As lajotas eram tendência de moda e design na classe média paulistana e também utilizadas pelo comércio local, contudo, durante os processos fabris, era comum a quebra de várias peças e para a fábrica aqueles produtos viravam então algo sem valor comercial, sendo armazenados e esquecidos.

Os funcionários da fábrica, que não tinham dinheiro para arcar com revestimentos cerâmicos, costumavam apenas cimentar as áreas externas de suas casas, até que um dos empregados, que estava terminando uma obra em sua nova casa, pediu para a fábrica doar-lhe parte daquele refugo, que não era utilizado, para finalizar sua obra particular e a fábrica prontamente aceitou o seu pedido.

A casa do funcionário, com um design até então nunca utilizado daquele modo, provocou comentários positivos entre a vizinhança, o que incluía muitos colegas da fábrica, resultando na replicação da ideia, mas ninguém imaginaria que a iniciativa viraria uma tendência, sendo inclusive matéria em jornais da época.

Uso de caquinhos no bairro do Cachambi, no Rio de Janeiro.

Semíramis Alice Paz

Com o boca a boca e a divulgação na mídia, a classe média também passou a ter interesse no piso de caquinhos cerâmicos, a procura começou a crescer e a fábrica passou a vender os caquinhos, mas o interesse era tão grande que os caquinhos passaram a ser vendidos por um valor superior ao das placas quadradas e o caquinho, que antes não tinham valor comercial, passou a ser tão requisitado, que a fábrica quebrava as peças inteiras para suprir a demanda dos clientes.

Para a arquiteta, Semíramis Alice Paz, o valor sentimental que esse piso carrega auxilia em seu uso e colabora para muitas pessoas mantê-lo. “Por muitos anos, este revestimento foi quase onipresente nas residências brasileiras. Muitos de nós deve ter brincado no quintal da casa da vó que tivesse o piso revestido com caquinhos cerâmicos. Esse tipo de revestimento tem um valor sentimental e afetivo e nos traz uma nostalgia gostosa”.

Caquinhos na Ilha de Paquetá, Rio de Janeiro.

A arquiteta diz também que por ser resíduo de um material que provavelmente seria descartado, há uma contribuição quanto a sustentabilidade, além de ser um piso de fácil manutenção. “Temos cada vez mais valorizado o artesanal e praticado a reciclagem, por isso, soluções como essa tem voltado à tona. Além de ser uma opção econômica e uma forma de reutilizar revestimentos que seriam descartados. E não é necessário o uso de mão de obra especializada para a instalação. É um piso que tem fácil manutenção. Além do mix de cores no padrão tradicional pode ser usado todo branco com o rejunte cinza e muitas outras combinações. Mesmo sendo um revestimento que era usado há muitos anos, ele traz um ar industrial, moderno e foge um pouco dos revestimentos que temos visto por aí”.

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Juliana Meneses é jornalista na Anicer.

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