Por Carlos Cruz
Cerca de 4 bilhões de pessoas vivem nas cidades. Esse número representa mais da metade da população mundial. E a tendência é que ele só aumente. Até 2050, cerca de 70% da população já deve estar morando em áreas urbanas. Os dados são da Organização das Nações Unidas (ONU). Toda essa expansão revela uma demanda maior por planejamento e organização dos espaços urbanos, que precisam responder da melhor forma aos desafios que surgem com o crescimento das cidades. O Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 11 da ONU prevê algumas iniciativas que devem ser tomadas para que a expansão das cidades aconteça de forma sustentável e garanta uma série de direitos à população que habita nesses centros.
Objetivo de Desenvolvimento Sustentável
Os ODS são uma agenda mundial de ações que visam à erradicação da pobreza, à proteção do meio ambiente e ao bem-estar da população. O apelo foi firmado em 2015, durante a Cúpula das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, e prevê 17 objetivos e 169 metas a serem cumpridas até 2030. As metas e objetivos considerados no documento visam, sobretudo, à melhora da qualidade de vida das gerações futuras a partir de iniciativas sustentáveis.
Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 11
O ODS 11 trata especificamente das cidades: “Cidades e Comunidades Sustentáveis”. Ele desenvolve 7 metas claras a fim de que os centros urbanos, além de passarem por um desenvolvimento sustentável, possam também ser mais seguros, inclusivos e que a população possa usufruir de paz e prosperidade nessas áreas. As metas abarcam diferentes âmbitos a serem trabalhos dentro das cidades, começando com questões relativas à habitação, como o acesso à moradia e a urbanização das favelas. A melhoria da mobilidade urbana dentro dos grandes centros também é trabalhada no ODS 11, que prevê melhores condições dos transportes, a partir de preços justos, meios seguros e sustentáveis.
As metas também abarcam a necessidade de preservação do patrimônio cultural e natural, a redução no número de mortos e afetados por catástrofes e a redução dos impactos ambientais negativos. A última meta, dividida em subgrupos, trata da acessibilidade a espaços públicos seguros, inclusivos e verdes, principalmente para mulheres, crianças, idosos e pessoas com deficiência.
O que já foi feito em relação ao ODS 11- Brasil
Diversas cidades do Brasil e do mundo já deram pequenos passos em direção ao cumprimento das metas do ODS 11. A conscientização dos grandes centros urbanos a respeito da importância do desenvolvimento sustentável tem resultado em diferentes iniciativas que visam alcançar esse objetivo.
No Brasil, São Caetano do Sul, localizada no ABC Paulista, aparece em primeiro lugar no ranking das cidades brasileiras que possuem melhor desempenho com relação aos ODS’s, do Índice de Desenvolvimento Sustentável das Cidades (IDSC-BR). Atualmente, a cidade é considerada a mais sustentável do Brasil. O reconhecimento é consequência das metas ambientais estabelecidas pelo município e de seus avanços em relação à melhoria da qualidade de vida de seus habitantes. Neste sentido, São Caetano do Sul já atingiu 100% de alguns ODS’s, como o uso de energias renováveis e acessíveis, indústria, inovação e infraestrutura e a proteção da vida marinha.
O IDSC-BR oferece uma perspectiva geral do avanço das cidades brasileiras em relação a cada um dos ODS. Ele é composto por 100 indicadores e o Brasil é o único país do mundo que acompanha os desafios e conquistas de seus municípios na Agenda 2030. No ranking das cidades mais sustentáveis, depois de São Caetano do Sul, aparecem Jundiaí, Valinhos e Saltinho. Todos os 10 municípios da lista ficam localizados no Estado de São Paulo.
A capital paulista não fica para trás. São Paulo foi uma das cidades a aderir ao Compromisso Global da Nova Economia de Plástico e objetiva reciclar ou reaproveitar 100% das embalagens plásticas utilizadas. A cidade se destaca principalmente em questões relacionadas à produção de lixo, com metas que visam impactar positivamente o meio ambiente.
Em território nacional, de Norte a Sul, os municípios vêm adotando uma série de medidas para tornar os centros urbanos espaços mais seguros e verdes.
Em Recife, foi criado um planejamento estratégico a partir de planos urbanos e ambientais. O planejamento caminha em direção ao cumprimento da meta 11.5, ou seja, da redução de pessoas mortas ou prejudicadas por catástrofes. As medidas previstas estão relacionadas à mitigação, resiliência e adaptação às consequências da crise climática, visto que ⅓ dos habitantes da capital pernambucana moram em áreas de morro e ⅓ da população fica no nível do mar e consequentemente estão sujeitos a tragédias.
Outras conquistas – Demais países
Outras cidades mundo afora também buscam cumprir as metas estabelecidas nos ODS’s. É o caso de Paris, que se comprometeu em ser uma cidade com emissões zero até 2050. Para isso, a capital francesa estabeleceu 500 medidas em diferentes setores, inclusive na construção civil, para viabilizar o cumprimento desse objetivo. Além disso, entre 2004 e 2014, antes mesmo dos ODS’s serem estabelecidos, Paris reduziu cerca de 9,2% das emissões de Gases do Efeito Estufa, o que também mostra seu compromisso com o desenvolvimento sustentável.
Do outro lado do mundo, em Ningbo, na China, apesar da população composta por 8 milhões de habitantes, mais de 40 km² da cidade são de áreas protegidas, o que aproxima a cidade do cumprimento da meta 11.7.
Na Suíça, a cidade de Zurique também vem adotando diversas medidas ecologicamente corretas. Atualmente, cerca de 80% de sua energia vem de fontes renováveis, mais de 40% dos resíduos da cidade são reciclados e mais de 70% dos hotéis têm selo de sustentabilidade.
Desafios no cumprimento dos ODS’S
Apesar de muitas cidades brasileiras mostrarem seus bons resultados no que diz respeito a medidas sustentáveis, o país ainda apresenta diversos indicadores negativos relativos às questões ambientais. No ano passado, o Relatório Luz, que verifica a implementação dos ODS no Brasil, mostrou que o país se afastou do cumprimento dos objetivos estabelecidos na Agenda 2030 e não apresentou progresso em nenhuma das 169 metas. Ao contrário do que se esperava, 92 tiveram retrocesso, 27 ficaram estagnadas, 21 ameaçadas e 13 tiveram progresso insuficiente. Outras metas não foram listadas por falta de dados.
O mesmo relatório classificou alguns desafios que o Brasil ainda precisa enfrentar para o cumprimento da Agenda. Um deles é o aumento da pobreza, que em 2021 atingiu 62,9 milhões de brasileiros. Além disso, os investimentos do país na área ambiental não são suficientes, o que compromete o progresso das cidades em relação ao desenvolvimento sustentável. O relatório mostra que houve um aumento de 220% na liberação de agrotóxicos, o que evidencia que o Brasil não tem priorizado a diminuição de gases poluentes. A desigualdade social, que foi potencializada pela pandemia, é outra barreira que dificulta o cumprimento da Agenda 2030.
Quando se trata especificamente do ODS 11, outros desafios aparecem. Indo de encontro à meta 11.1, o número de ocupações irregulares não está diminuindo. Um levantamento do IBGE de 2019 mostrou que 13,2% das cidades possuíam aglomerados subnormais. Enquanto isso, a meta 11.2 também permanece longe de acontecer. O IBGE apontou que o transporte compromete cerca de 20% do orçamento das famílias que sobrevivem com até dois salários, superando os gastos com alimentação. O preço acessível, que é estabelecido na meta, ainda não faz parte da realidade das cidades. Além disso, os centros urbanos do país que têm responsabilidade com o gerenciamento de resíduos sólidos são exceções. Um relatório da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) mostra que 40,5% do lixo total coletado em 2018 teve despejo inadequado em lixões ou aterros controlados.
Ainda há muito a ser feito para que as cidades do Brasil e do mundo consigam cumprir as metas estabelecidas no ODS 11. Para isso, é necessário não só a conscientização da população, mas principalmente o investimento dos governos e o uso adequado dos recursos. Mais do que uma lista de metas, o cumprimento dos ODS é fundamental para garantir que as próximas gerações vivam com segurança e qualidade de vida e o meio ambiente seja preservado.
Meta 11.1
Nações Unidas
Até 2030, garantir o acesso de todos à habitação segura, adequada e a preço acessível, e aos serviços básicos e urbanizar as favelas.
Brasil
Até 2030, garantir o acesso de todos a moradia digna, adequada e a preço acessível; aos serviços básicos e urbanizar os assentamentos precários de acordo com as metas assumidas no Plano Nacional de Habitação, com especial atenção para grupos em situação de vulnerabilidade. +
Meta 11.2
Nações Unidas
Até 2030, proporcionar o acesso a sistemas de transporte seguros, acessíveis, sustentáveis e a preço acessível para todos, melhorando a segurança rodoviária por meio da expansão dos transportes públicos, com especial atenção para as necessidades das pessoas em situação de vulnerabilidade, mulheres, crianças, pessoas com deficiência e idosos.
Brasil
Até 2030, melhorar a segurança viária e o acesso à cidade por meio de sistemas de mobilidade urbana mais sustentáveis, inclusivos, eficientes e justos, priorizando o transporte público de massa e o transporte ativo, com especial atenção para as necessidades das pessoas em situação de vulnerabilidade, como aquelas com deficiência e com mobilidade reduzida, mulheres, crianças e pessoas idosas. +
Meta 11.3
Nações Unidas
Até 2030, aumentar a urbanização inclusiva e sustentável, e as capacidades para o planejamento e gestão de assentamentos humanos participativos, integrados e sustentáveis, em todos os países.
Brasil
Até 2030, aumentar a urbanização inclusiva e sustentável, aprimorar as capacidades para o planejamento, para o controle social e para a gestão participativa, integrada e sustentável dos assentamentos humanos, em todas as unidades da federação. +
Meta 11.4
Nações Unidas
Fortalecer esforços para proteger e salvaguardar o patrimônio cultural e natural do mundo.
Brasil
Fortalecer as iniciativas para proteger e salvaguardar o patrimônio natural e cultural do Brasil, incluindo seu patrimônio material e imaterial. +
Meta 11.5
Nações Unidas
Até 2030, reduzir significativamente o número de mortes e o número de pessoas afetadas por catástrofes e substancialmente diminuir as perdas econômicas diretas causadas por elas em relação ao produto interno bruto global, incluindo os desastres relacionados à água, com o foco em proteger os pobres e as pessoas em situação de vulnerabilidade.
Brasil
Até 2030, reduzir significativamente o número de mortes e o número de pessoas afetadas por desastres naturais de origem hidrometeorológica e climatológica, bem como diminuir substancialmente o número de pessoas residentes em áreas de risco e as perdas econômicas diretas causadas por esses desastres em relação ao produto interno bruto, com especial atenção na proteção de pessoas de baixa renda e em situação de vulnerabilidade. +
Meta 11.6
Nações Unidas
Até 2030, reduzir o impacto ambiental negativo per capita das cidades, inclusive prestando especial atenção à qualidade do ar, gestão de resíduos municipais e outros.
Brasil
Até 2030, reduzir o impacto ambiental negativo per capita das cidades, melhorando os índices de qualidade do ar e a gestão de resíduos sólidos; e garantir que todas as cidades com acima de 500 mil habitantes tenham implementado sistemas de monitoramento de qualidade do ar e planos de gerenciamento de resíduos sólidos. +
Meta 11.7
Nações Unidas
Até 2030, proporcionar o acesso universal a espaços públicos seguros, inclusivos, acessíveis e verdes, particularmente para as mulheres e crianças, pessoas idosas e pessoas com deficiência.
Brasil
Até 2030, proporcionar o acesso universal a espaços públicos seguros, inclusivos, acessíveis e verdes, em particular para as mulheres, crianças e adolescentes, pessoas idosas e pessoas com deficiência, e demais grupos em situação de vulnerabilidade. +
Meta 11.a
Nações Unidas
Apoiar relações econômicas, sociais e ambientais positivas entre áreas urbanas, peri-urbanas e rurais, reforçando o planejamento nacional e regional de desenvolvimento.
Brasil
Apoiar a integração econômica, social e ambiental em áreas metropolitanas e entre áreas urbanas, periurbanas, rurais e cidades gêmeas, considerando territórios de povos e comunidades tradicionais, por meio da cooperação interfederativa, reforçando o planejamento nacional, regional e local de desenvolvimento. +
Meta 11.b
Nações Unidas
Até 2020, aumentar substancialmente o número de cidades e assentamentos humanos adotando e implementando políticas e planos integrados para a inclusão, a eficiência dos recursos, mitigação e adaptação às mudanças climáticas, a resiliência a desastres; e desenvolver e implementar, de acordo com o Marco de Sendai para a Redução do Risco de Desastres 2015-2030, o gerenciamento holístico do risco de desastres em todos os níveis.
Brasil
Até 2030, aumentar significativamente o número de cidades que possuem políticas e planos desenvolvidos e implementados para mitigação, adaptação e resiliência a mudanças climáticas e gestão integrada de riscos de desastres de acordo com o Marco de SENDAI. +
Meta 11.c
Nações Unidas
Apoiar os países menos desenvolvidos, inclusive por meio de assistência técnica e financeira, para construções sustentáveis e resilientes, utilizando materiais locais.
Brasil
Apoiar os países menos desenvolvidos, inclusive por meio de assistência técnica e financeira, para construções sustentáveis e robustas, priorizando recursos locais. +
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