Por Edson Ribeiro* – Artigo originalmente publicado na Revista da Anicer nº 100 | Imagem: acervo pessoal
A precificação é ciência, pois trata de fatores quantitativos, portanto objetivos (custos, despesas, tributos, comissão etc.), mas também possui um viés de arte, já que trata de fatores subjetivos (necessidades individuais e coletivas, gosto, marca etc.).
Um preço estratégico é o produto do melhor arranjo entre esses fatores, associado a uma ampla discussão entre os profissionais de no mínimo quatro áreas da empresa: comercial, marketing, operações e finanças. A questão é que encontrar profissional que pensa o preço de venda objetivamente e subjetivamente e que ainda consiga transitar fácil em todas as áreas, é um problema maior do que o problema de recessão econômica. Penso assim, pois, em economia crescente ou em recessão, lapidar o preço é um desafio para os gestores. É claro que quem não se preocupou em aprimorar sua metodologia de precificação em um período de economia crescente encontrará na recessão uma dificuldade maior para este desafio.
Vamos considerar duas empresas hipotéticas para exemplificar a afirmação anterior: a primeira empresa entrou no período de recessão com o caixa organizado, as contas em dia, sem atrasos, baixo índice de endividamento, custos controlados e equilibrados, atualizada tecnologicamente e com noção clara do seu mercado e da sua política comercial. A segunda empresa entrou no mesmo período com um alto índice de endividamento de curto prazo, portanto, altos desembolsos mensais e fixos, com o caixa tendendo ao desequilíbrio, custos altos, baixa vocação mercadológica, sem norte comercial. Mas também atualizada tecnologicamente, até porque, em alguns casos, foi a atualização tecnológica mal planejada que gerou o desequilíbrio financeiro.
É prudente primeiro entender onde e como se encontra a empresa, do ponto de vista da sua história e depois, entender o mercado e a concorrência.
As duas empresas, mesmo que em situações opostas, possuem desafios em precificar, porém, lamentavelmente o critério utilizado para o primeiro cenário pouco será útil para resolver as questões do segundo. A questão da precificação reside muito mais em entender em qual cenário encontra-se a empresa do que nos critérios que serão adotados para este fim. Em síntese, é prudente primeiro entender onde e como se encontra a empresa, do ponto de vista da sua história e depois, entender o mercado e a concorrência. Em seguida, descobrir as restrições organizacionais que impedem o processo de precificação estratégica e, por fim, reagir às proposições do mercado de forma proativa.
Ainda utilizando como exemplo as hipóteses anteriores, é possível afirmar que a empresa com problemas estruturais vai praticar concorrência desleal, pois será questão de sobrevivência para esta. Primeiro vai aumentar o prazo, depois vai reduzir o preço, até mesmo reduzir a performance do produto para suportar as ações de redução de preço e aumento do prazo. E a empresa melhor estruturada, não pode ser desleal também? Enxergando uma fraqueza do concorrente e baixando o preço para acelerar a crise deste?
Parece estranho conceituar lealdade em um mercado de livre concorrência. Quando você abre uma empresa, você não casa com o mercado, você faz parte do mercado e age da forma que melhor entender para garantir a sobrevivência do seu negócio. Isso é um campo de observação muito complexo, sendo necessário analisar bem o ponto de vista de cada concorrente.
Objetivamente, ser competitivo em preço pode não significar ter o menor preço, depende em que mercado a empresa atua. Se for um mercado de estratégia operacional de custo, que requer alto volume, preço baixo é determinante. Para isso, as contas devem estar alinhadas à estratégia. Cerâmica Vermelha, atualmente, precisa de volume alto, com isso requer preço competitivo. E fazer isso sem vocação orçamentária, com controle efetivo dos custos e investimentos é trilhar caminhos perigosos. Algumas empresas, que nos últimos anos não se preocuparam com a estratégia, estão fazendo isso agora e sairão deste período recessivo fortalecidas para crescer de forma mais estruturada. E nesta nova estruturação entra a função de precificação também.
Objetivamente, ser competitivo em preço pode não significar ter o menor preço, depende em que mercado a empresa atua.
A estratégia para definir os preços de produtos qualificados (por exemplo, selo do PSQ), sem torná-los economicamente inviáveis para o consumidor, é fazer com que os compradores percebam esta qualificação. A questão, que não é fácil é fazer isso quando o produto é commoditie, que requer um posicionamento estratégico de custos, o que de certa forma é o que acontece com a cerâmica vermelha. Devemos perceber que certificações já agregaram mais valor aos produtos, porém, esta percepção vem reduzindo com os anos.
Em estratégia, quando todos têm uma competência, esta funciona apenas como critério qualificador. Se você não tiver, faz falta. Mas se tiver, agrega pouco, ou seja, tem que ter apenas para se igualar na competição. A empresa tem que se qualificar, mas não pode morrer para isso. Muitas se qualificaram e não conseguiram agregar esta qualificação ao preço do produto, e não foi só por precificação equivocada, talvez por falta de investimento em marketing. Se a empresa investir no produto, precisa investir em treinamento da sua força de venda, buscando negociações mais eficazes, que possam fazer o cliente entender e comprar o valor que foi adicionado ao produto. Caso contrário é mais custo com o mesmo preço, isto é, menos resultado.
Eu conheço poucos produtos no mercado nacional que apresentam tanta variação de preço por região como o que acontece com tijolos e telhas. Em um dado momento era possível encontrar tijolo de R$ 200 o milheiro em uma região e R$ 380 em outra. Quando o comprador, seja do varejo, atacado ou construtora, mesmo não podendo comprar um produto barato de uma distância muito grande, ele questiona: por que tanta variação? E este questionamento é mais um impeditivo para o aumento de preço. Percebo que toda vez que o mercado aquece, dando margem para a valorização do produto, através de melhorias estruturais para a capacidade já instalada e favorecendo a agregação de valor, os competidores investem mais em aumento de capacidade. Normalmente o fazem em produtos que existem em excesso. Com isso acontece o oposto: excesso de oferta e competição por preço, mesmo que a qualidade tenha aumentado.
Temos que lembrar que antes do consumidor perceber a melhoria da qualidade, intuitivamente já percebeu o excesso de oferta, neste caso aguarda o leilão. Temos que lembrar também que o consumidor já aprendeu que as plantas agora possuem processos contínuos e ininterruptos, o que força o fabricante vender ou amargar com altos estoques. Gosto da ideia de melhorar a qualidade dos produtos, mas é preciso esclarecer que qualidade e excesso de volume, em muitos casos são antagônicos.
* Edson Firmino Ribeiro é Professor das disciplinas de formação de preço de venda do Senac de Santa Catarina e administração da produção e custo gerencial da Universidade do Extremo Sul Catarinense (Unesc). Possui especialização em Gestão da Qualidade, Engenharia Econômica pela Unesc e mestrado em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Atua como consultor de empresas nas áreas de custos, operações e estratégias de precificação.
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