Hoje é:20 de setembro de 2024

Uma nova experiência

O Metaverso chegou para gerar novas oportunidades e experiências na execução e venda de projetos

Por Carlos Cruz | Imagem: Divulgação Be Garden, Cindy Ord/Getty Images

O lugar de convergência entre a vida física e a realidade digital vai lentamente deixando de ser imaginário para se tornar uma realidade comum. O metaverso, esse tal espaço de encontro, já é considerado por muitos especialistas como sendo um futuro próximo e inevitável, e promete trazer muitas mudanças para o nosso cotidiano. Entre elas, novas formas de exercermos algumas profissões no ambiente físico, como, por exemplo, a arquitetura.

Conversamos com o cofundador e advisor da Teevo S/A, SOU.cloud e Nexo Governança Corporativa, Rodrigo de Castro, que há 25 anos se dedica à área de tecnologia, com trabalhos voltados principalmente para o campo da inovação e transformação digital e da abordagem em tecnologias para empresas. “O metaverso é espaço virtual onde a pessoa física e a pessoa digital se unem em uma realidade única e interagem mutuamente”, define o especialista.

Nesse espaço, as pessoas estarão representadas, principalmente, em forma de avatar. “A gente poderia estar fazendo uma videoconferência com uma pessoa digital, por exemplo, com um avatar. Existe sala, cadeira, mesa, escada, estrada, carro, prédio, avião, existem as mesmas coisas, existe lugar pra festa, existe hospital, como existe na parte física, só que ela é digital”, resume Castro.

O metaverso possui diferentes características, todas muito parecidas com o que acontece no ambiente físico. De acordo com o relatório “Into To Metaverse”, da Wunderman Thompson, a tecnologia é caracterizada por algumas palavras-chaves:

Social – um local de socialização;

Persistência – existência contínua; a vida continua com as pessoas online ou não;

Reativo – as reações acontecem em tempo real;

Interoperável – não pertencerá a nenhuma plataforma;

Criatividade – os usuários poderão se envolver ativamente, não apenas consumir conteúdo passivamente;

Ilimitado – usuários, experiências e mundos ilimitados;

Dia a dia – estará ligado às nossas atividades diárias;

Descentralizado – a propriedade será distribuída, não será limitado a pessoas ou empresas;

Definido pelos usuários – personalizados pelas pessoas que vivem e participam desse lugar.

Rodrigo acrescenta que uma importante característica do metaverso é que ele é um espaço geoespacial e que permite experiências sensitivas, não apenas visuais. “Você percebe em cima, embaixo, atrás, na frente, calor, cheiro, gosto, frio. Você sente essas coisas”, explica.

Além disso, o metaverso é também um ambiente contextualizado, onde o usuário pode criar experiências com a participação de outras pessoas. “Você cria uma loja física. A pessoa vai visitar sua loja e se encantar com o mobiliário, com as cores, com o vidro, com luzes, com cheiro, com carpete, com a cerâmica da parede. Ela vai sentir como se estivesse no ambiente físico que ela está. No metaverso, a gente consegue criar isso também, só que digitalmente”, afirma.

Esse ambiente digital também irá revolucionar os modelos de negócio, segundo Castro, causando uma migração. “Ele é mercadológico, então você consegue gerar negócios entre as pessoas. Eu compro, você vende. Eu tenho aqui uma loja virtual e você compra um produto que pode ser entregue na sua casa fisicamente. É um ambiente para compra e venda de produtos e prestações de serviços também, para construção, para produção de produtos” reitera o CEO.

Para estar conectado ao metaverso, existem alguns dispositivos que permitem uma melhor experiência. Os principais e mais conhecidos são os óculos 3D, que, de acordo com Rodrigo, podem proporcionar três tipos de realidade:

a) realidade virtual: você se sente dentro do ambiente;

b) realidade misturada: você vê coisas digitais em cima de coisas físicas;

c) realidade ampliada: você consegue mudar o ambiente físico através do digital.

Esses aparelhos estão sendo cada vez mais desenvolvidos para proporcionar diferentes sensações. “À medida que avança na tecnologia, você tem óculos que te dão sensação de calor e frio, tem sensores que te fazem sentir cheiros. E é um sensor mesmo, é um sensorzinho que a gente coloca perto do nariz. Ele emite ondas elétricas e você sente doce, salgado, cheiros, cheiro bom, cheiro ruim e por aí vai”, conta Rodrigo. O especialista acrescenta que também existem luvas que permitem sentir o peso dos objetos, chamadas luvas hápticas, e armaduras, que em alguns jogos proporcionam sensações de peso ou batidas no corpo.

Mas os que não tiverem esses aparelhos não serão impedidos de participar do metaverso. “Tem muitas experiências de metaverso hoje que acontecem na tela do computador, sem você ter que instalar nada. Você consegue enxergar o ambiente 3D sem ter um óculos. Hoje já tem bastante tecnologia sendo usada pra isso. À medida que as pessoas vão tendo experiências melhores, aí vai tendo que ter mais hardware, mais dispositivos para poder chegar mais longe”, analisa.

Metaverso em âmbito nacional

Engana-se quem pensa que o Brasil está atrasado no que se refere a experiências do metaverso. De acordo com Rodrigo, o país já está bem avançado na tecnologia. “Mais do que a demanda, o Brasil é um lugar onde as coisas estão acontecendo mais rápido do que em outros lugares do mundo, que sempre adotou as tecnologias muito rapidamente. Então já existem, aqui no Brasil, shoppings criados no metaverso, lojas, prédios para alugar. Já dá pra comprar carro no metaverso, casa, iate, dá até pra fazer aula”, afirma.

Ainda existem alguns desafios para que haja a expansão desse espaço no país, mas o principal deles já está sendo resolvido com a chegada do 5G. “O 5G é uma tecnologia que resolve bem o problema. O metaverso, como tem uma qualidade muito alta por ser quase real, aliás, pra quem está usando os equipamentos ela é uma experiência real, ele consome muita internet, muito processamento da máquina, tem que ter um Wi-Fi bom. Então, isso são coisas que agora com o 5G vão acelerar bastante”, explicou.

Outro desafio listado por Rodrigo no ramo dos negócios é a respeito dos aparelhos, que não são obrigatórios, mas que irão proporcionar experiências melhores para os clientes. Além disso, informações equivocadas a respeito do metaverso também são uma barreira na expansão desse espaço no Brasil. “Parece que metaverso é uma coisa de joguinho, de gurizada e não tem nada a ver. É uma coisa de empresa, que gera negócio, que atrai as pessoas e gera novos hábitos, novos comportamentos de consumo”, esclarece.

Em relação a mercado e design, Rodrigo afirma que não há nenhum impedimento para o avanço do metaverso. “Alguém vai lá na minha loja pra escolher a decoração que vai usar no seu apartamento, não tem barreira nenhuma. Monto a estrutura na minha loja, quando a pessoa vier me visitar, eu faço ela imergir num ambiente que ela não teria condição de ter em casa, por exemplo” conclui.

O metaverso tem potencial para mudar o dia a dia das pessoas

O fundador do Roomkey, Don Steim, chegou a dizer que em 100 anos, a humanidade irá passar horas do seu dia como um “avatar em um mundo virtual”. De acordo com Castro, essa mudança irá acontecer, não porque a tecnologia permite ou porque as empresas querem, mas porque o mundo está mudando em torno disso. Ele relembrou que já aconteceu o fashion week dentro do metaverso, que algumas lojas virtuais já aceitam criptomoedas como pagamento, e que, enquanto a Ucrânia, com a guerra, recebeu doações em criptomoedas e em ambiente digital, a Rússia criou moedas digitais como forma de ultrapassar as sanções internacionais que estava vivendo e conseguir fazer as transações que precisava.

No Brasil, Castro reitera que o ministro da economia, Paulo Guedes, também está com um projeto de criação de uma moeda digital brasileira, a CDBC, que, de acordo com o especialista, irá funcionar como um real digital. “A sociedade está mudando, e quando mudam as possibilidades, as pessoas mudam lá para dentro, porque tem coisa legal pra fazer. E aí, elas levam o dinheiro que elas ganham trabalhando aqui pra gastar lá e lá começa a ter dinheiro também. E aí, surgem necessidades lá que as pessoas começam a usufruir. E o dinheiro que gera lá vem para o mundo real também. Então, começa uma troca de vai e volta e aí não para mais. Isso vai mudar bastante o hábito de consumo, o hábito de comportamento”, considera.

Metaverso e Arquitetura

Os profissionais de arquitetura interessados já podem migrar para o metaverso, apostando nesse ambiente para, finalmente, tirarem seus projetos do papel por meio de diversos recursos e modalidades de venda.

Se, por um lado, o principal objetivo do arquiteto é projetar um espaço que gere a melhor experiência possível para o cliente, por outro, a relação entre ambos demanda muita confiança, característica que ainda será impulsionada pelo metaverso.

“A hora que eu tenho um ambiente digital, em que eu posso mostrar o projeto para o cliente antes de começar a mexer na casa ou na empresa dele, e ele conseguir trabalhar dentro deste ambiente digital como se estivesse no ambiente físico, já sabendo antes qual vai ser a experiência, a chance de fechar melhores negócios, negócios mais caros, que geram mais retorno para o cliente e para o arquiteto é muito maior”. E acrescenta: “E a chance da construtora fazer exatamente o que o arquiteto quer, também é muito maior, porque você não está imaginando, você está vendo essas coisas acontecerem”.

Mas como o metaverso consegue criar realidades virtuais com tamanha precisão? Rodrigo explica que isso acontece porque o metaverso é feito a partir de vivências da vida física. Outra grande vantagem é que os projetos são desenvolvidos sem as limitações ou restrições do mundo físico. “Se as pessoas podem ter uma experiência melhor no metaverso do que elas têm no ambiente físico, o que vai acontecer é que as pessoas vão começar a investir num ambiente digital e passar mais tempo lá dentro. Então imagina que eu moro num apartamento de quarto em sala, na periferia do Rio de Janeiro, numa rua barulhenta, um pouco perigosa, e não tenho grana pra sair dali. Mas eu tenho amigos, eu gosto de reunir os meus amigos e aí, eu contrato um arquiteto para criar um ambiente virtual, que se parece com a minha casa, mas já é um pouco melhor, e eu começo a fazer reuniões com meus amigos no ambiente virtual”, destaca.

E se antes os projetos arquitetônicos não podiam ser reaproveitados para outros clientes, com o metaverso poderão, sendo inclusive oferecidos a clientes em qualquer lugar do mundo. “Claro que ele tem que estar atento à norma e legislação daquele país, mas no caso do arquiteto que trabalha muitas vezes com projetos que não são estruturais, é perfeitamente possível trabalhar em qualquer lugar do mundo. Para aqueles que são mais ligados a projetos estruturais, ponte, prédio e tudo mais, aí tem que se adequar à legislação local e saber as regras urbanísticas da região que ele tá”, explica Castro.

Projetos em destaque

Be Garden- Maringá

O primeiro condomínio do mundo no metaverso fica no Brasil. O Be Garden, que nasce de uma parceria entre a Bravo Empreendimentos e a imobiliária Silvio Iwata Prime, fica localizado em Maringá, no Paraná. “A unidade virtual vem junto com a compra de um apartamento real, então você compra o apartamento real e ganha o apartamento no metaverso. O empreendimento já está com 60% das unidades reservadas. Esse é um caso legal e funciona”, explica Rodrigo. O modelo ainda permite que o comprador acompanhe o processo de construção do apartamento em tempo real.

Os clientes que comprarem um apartamento no Be Garden irão receber dois NFTs, criados e entregues pela Insignia. Um irá servir de carteirinha de filiação aos participantes do Insignia Club, garantindo benefícios exclusivos do clube, e outro será para permitir o acesso à construção no metaverso, assegurando também a propriedade da unidade virtual.

Art Basel Miami 2021

O Art Basel Miami, evento de artes que reúne galerias de todo o mundo, explorou NFTs na edição de 2021. O espaço contou com as atividades virtuais, além das presenciais, projetadas para proporcionar a experiência imersiva dos visitantes a partir de exposições interativas. A edição contou com a participação de 34 países, totalizando mais de 250 galerias, que exibiram suas obras físicas ao lado de digitais.

“Você entra no museu pelo metaverso e experimenta tudo da sua casa, sem precisar ir pra Miami, por exemplo”, contou Castro. Uma das galerias virtuais apresentadas foi a da empresa britânica de arquitetura e design Zaha Hadid Architects. A exposição, intitulada como NFTism, utiliza ferramentas de design paramétrico testadas em campo, gerando novos resultados para o público online.

Carlos Cruz é jornalista na Anicer.

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