Hoje é:9 de maio de 2024

Reforma Tributária: onde estamos e para onde vamos?

Por Eduardo F. de Souza Weyll

O conteúdo deste artigo não necessariamente reflete a opinião da Anicer e é de responsabilidade de seu autor.

Demanda antiga da sociedade brasileira, a reforma tributária encabeçou a lista de prioridades do governo federal nesse início de mandato. Isso porque o nosso Sistema Tributário Nacional, é basicamente estruturado, por uma Lei de 1.966[1] e a Constituição Federal que data ao ano de 1.988, que se mostraram há bastante tempo não serem as normas ideais para tratar as relações existentes no momento contemporâneo. Por isso a reforma tributária faz parte dos debates econômicos e acadêmicos desde o ano de 1.992. Desde essa época já era disseminada na sociedade a ideia de que a reforma tributária era necessária para que houvesse uma alavancagem na economia e um crescimento sustentável no país. Não era mais possível que um tema vital para o país continuasse sendo postergado.

A carga tributária brasileira é correspondente a de um país desenvolvido, a legislação é cada vez mais complexa e confusa, os desembolsos atrelados ao cumprimento das obrigações tributárias que indiretamente são exigidos dos contribuintes implicam em custos elevados. Para se ter uma ideia, segundo a pesquisa realizada pela Doing Business[2] no ano de 2020, elaborada pelo Banco Mundial, o Brasil gasta uma média de 1.501 horas por ano para cumprir com suas obrigações fiscais, enquanto a média da América Latina e Caribe é de 317,1 horas por ano e os países da OCDE de alta renda a média é de 158.8 horas por ano. Combinando burocracia, complexidade e a alta carga tributária, temos uma estrutura anárquica, de alto custo e injusta, que, em muitos casos, inviabiliza desde pequenos negócios a atração de investimentos estrangeiros.

Conforme vulgarmente noticiado pela imprensa, no dia 06/07/2023 o Substitutivo da Proposta de Emenda Constitucional nº. 45/2019 (PEC), que altera o Sistema Tributário Nacional (“Reforma Tributária”), foi aprovado em 2 turnos pela Câmara dos Deputados. Atualmente a PEC está sendo analisada pelo Senado Federal, que poderá aprovar no formato que foi proposto, rejeitá-la ou alterá-la. Nessa última hipótese, o texto retornará para Câmara para deliberação das alterações realizadas.

Feito a devida contextualização do ambiente de debate onde está inserido a Reforma Tributária (PEC), vamos às principais alterações trazidas pela Proposta de Emenda constitucional nº. 45/2019.

Principais Mudanças

A Reforma Tributária tem como principal objetivo a simplificação da tributação, criando para tanto um modelo dual de tributação sobre o valor agregado. Dessa forma haverá alteração significativa dos tributos sobre o consumo e da repartição das receitas geradas na arrecadação desses tributos.

A proposta tem quatro principais pilares, quais sejam: Simplicidade – Facilidade na interpretação e aplicação das normas -, Justiça Tributária – Observância da capacidade contributiva -, Transparência – Clareza sobre a carga tributária incidente -, e Equilíbrio e Defesa do Meio Ambiente – Tributos verdes -.

Considerando o atual texto substitutivo da PEC 45, elencamos as principais diferenças entre o sistema de tributação sobre o consumo atual e o Imposto de Valor Agregado – IVA. Confira a seguir.

Micro e Pequena Empresa, Simples Nacional e a Industria da Cerâmica

No Brasil, os pequenos negócios empresariais são formados pelas micro e pequenas empresas (MPE) e pelos microempreendedores individuais (MEI). Segundo o SEBRAE[3], existem 6,4 milhões de estabelecimentos registrados em todo território nacional. De acordo com o Portal do Empreendedor, existem aproximadamente 15,2 milhões de MEI (julho/2023)[4] registrados.

Juntos os pequenos negócios correspondem a 98% das empresas do país, 67% das pessoas ocupadas[5], 56% dos empregados com carteira assinada (CLT), 62% das empresas exportadoras, 2,3% do valor das exportações, 20% do PIB[6].

Mais de 90% dos pequenos negócios empresariais são optantes pelo regime tributário do Simples Nacional. Na Indústria Cerâmica não é diferente, a maioria de seus atores recolhem seus tributos através do Simples Nacional.

Diante dos números e de circunstâncias tão expressivas, passaremos a tratar especificamente da reforma tributária no cenário da micro e pequena empresa que recolhe seus tributos através do regime simplificado. O Simples Nacional é um regime tributário que objetiva simplificar o pagamento de tributos das empresas que tenham a receita bruta de até R$ 4,8 milhões.

O texto da PEC aprovado mantém o tratamento diferenciado e favorecido para as sociedades optantes pelo Simples Nacional no âmbito do IVA (IBS + CBS), podendo o Contribuinte escolher adotar o IVA (IBS + CBS), passando assim a ter direito a crédito dos tributos pagos na cadeia anterior.

Com a previsão na proposta de reforma tributária da não cumulatividade plena, isso é, a possibilidade de descontar os impostos pagos ao longo da cadeia com insumos nos processos produtivos por meio de créditos, calculando o imposto somente sobre o valor adicionado, pode-se criar um cenário bem favorável para setores do comércio e das pequenas indústrias, que adquirem mercadoria, insumos em gerais e não tenham um valor de folha impactante sobre o faturamento.

Por isso os Ceramistas precisarão avaliar e simular com muita atenção se o novo regime criado não será mais vantajoso do que o regime do Simples Nacional. Não é possível fazer esses cálculos hoje, pois a reforma, se aprovada, dependerá de Lei Complementar para instituir alíquotas e algumas definições da não cumulatividade. Mas é ventilado nas paredes do Congresso e defendido pelo Ministério da Fazenda uma alíquota de 25%. Se nos basearmos nessa alíquota e considerarmos um cenário de uma Cerâmica que tenha um volume de crédito considerável e um valor de folha de pagamento não tão impactante (ou ter sua força de trabalho contratada de forma terceirizada), somos levados a acreditar que a alíquota efetiva (do IVA) provavelmente será menor do que a alíquota do Simples Nacional.

Dessa forma, a depender da futura regulamentação por Lei Complementar e da situação específica da pequena indústria (volume de mercadorias, insumos e folha de pagamento), o Simples Nacional poderá deixar de ser atrativo em razão da não cumulatividade implementada com a reforma tributária.

Cronograma de implementação

A CBS e o IBS serão cobrados a partir de 2026 com uma alíquota teste e, gradualmente, as citadas contribuições federais (PIS e COFINS) e imposto federal (IPI), estadual (ICMS) e municipal (ISSQN) serão extintos até 2033. Assim, a transição para o novo modelo se inicia em 2026 e encerra em 2033, sendo 08 (oito) anos no total, período este em que serão extintos gradativamente os tributos atuais, na medida em que serão criados e calibrados a CBS e o IBS.

Os créditos acumulados e não utilizados no período de transição serão atualizados pelo IPCA e compensados com o IBS em parcelas de até 240 meses. No mais, caberá à Lei Complementar definir as regras para estas compensações, para transferências a terceiros ou restituição de saldos credores.

Outras Mudanças: IPTU, IPVA e ITCMD

Além da criação do IVA Dual, a PEC 45/2019 também prevê alteração nos seguintes impostos:

  • IPTU – A base de cálculo do imposto poderá ser atualizada por meio de decreto do executivo, desde que atenda os critérios previstos na lei municipal.
  • IPVA – Cria-se hipótese de incidência tributária, com a incidência para proprietários de veículos aquáticos e aéreos. Poderá haver alíquotas diferenciadas em função do tipo, do valor, da utilização e do impacto ambiental. Estariam isentos da tributação do IPVA aeronaves e veículos licenciados para a prestação de serviços (táxi-aéreo), embarcações de empresas de transporte ou pesca e plataformas marítimas.
  • ITCMD – Instituição da progressividade das alíquotas em razão do valor da transmissão ou da doação, ou seja, quanto maior forem os valores transmitidos ou doados, maior será a alíquota. Fica definida a incidência do ITCMD nas transmissões/doações realizadas por residentes no exterior, tudo a depender da regulamentação da Lei Complementar. Até a edição da Lei Complementar, a competência para tributação dos bens móveis, títulos e créditos será do Estado de domicílio do falecido.

[1] Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966.

[2] https://archive.doingbusiness.org/pt/data/exploreeconomies/brazil#DB_tax – Acesso em: 01.08.2023

[3]http://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/ufs/sp/sebraeaz/pequenos-negocios-em-numeros,12e8794363447510VgnVCM1000004c00210aRCRD – Acesso em: 01.08.2023

[4] http://www22.receita.fazenda.gov.br/inscricaomei/private/pages/relatorios/opcoesRelatorio.jsf – Acesso em: 01.08.2023

[5] Pessoas ocupadas no setor privado. Inclui todos os tipos de ocupações: sócios-proprietários, familiares e empregados com e sem carteira.

[6] http://www.sebrae.com.br/Sebrae/Portal%20Sebrae/UFs/SP/Pesquisas/resultado_mpe_brasil.pdf – Acesso em: 01.08.2023

Advogado inscrito na OAB/RJ sob o nº 173.534, com atuação específica em Direito Tributário, Administrativo e em Direito Empresarial, Administrador Judicial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Técnico em Empreendedorismo, Bacharel em Ciências Contábeis, Pós-graduado em Direito Tributário pela Universidade Cândido Mendes, L.L.M. (Master of Laws) em Direito Corporativo pelo IBMEC, membro efetivo do Turnaround Management Association do Brasil – TMA Brasil e International Association of Restructuring, Insolvency & Bankruptcy Professionals – INSOL e membro efetivo do Grupo de Debates Tributários do Rio de Janeiro (GDT-RIO). Com 12 anos de experiência profissional, o Sócio da SMGA é responsável pela atuação consultiva e pelo contencioso de direito público e direito falimentar do escritório, especialmente no que diz respeito ao direito tributário.

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