Hoje é:18 de maio de 2024

Robson Braga de Andrade

O presidente da CNI, Robson Braga de Andrade, conversou com a Revista da Anicer e falou sobre as perspectivas da construção civil para os próximos meses

Por Carlos Cruz | Imagem: Iano Andrade/CNI

Revista Anicer – Passada a pandemia, o que podemos esperar da indústria para este ano? O que é preciso para reduzir os efeitos da pandemia?

Robson Andrade – A guerra travada na Ucrânia trouxe mais incerteza para a economia global, que ainda não havia se recuperado plenamente dos efeitos negativos da pandemia da covid-19. Diante dessa conjuntura tão difícil quanto indesejada, o Brasil precisa adotar medidas corretas para incentivar o crescimento econômico, a geração de empregos e a multiplicação da renda.

Para retomar o crescimento da economia, é fundamental que sejam implementadas algumas reformas estruturais. A mais urgente e importante é a reforma tributária,  especificamente a mudança na incidência de impostos sobre o consumo. A aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 110/2019, que cria o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) Dual, é imprescindível, pois eliminará distorções, simplificará o sistema, e desonerará exportações e investimentos.

O aumento do crescimento com a PEC 110 vai beneficiar todos os setores econômicos. Por isso, a aprovação da PEC 110 vai representar um ganho para o País e, sobretudo, para os brasileiros. Segundo estudo da UFMG, com a PEC 110 a economia brasileira vai crescer 12% a mais em 15 anos. Com isso, a agropecuária terá crescimento adicional de 10,6%, o setor de serviços terá crescimento adicional de 10,1% e a indústria terá crescimento adicional de 16,6%.

Outra prioridade será a reabertura do Programa Especial de Regularização Tributária (Pert) para que as empresas, que foram muito afetadas pela pandemia, possam se manter em dia com as obrigações fiscais.

Também é necessário aprovar o projeto sobre a tributação de lucros auferidos no exterior por pessoas jurídicas residentes no Brasil.

Há importantes propostas em tramitação no Congresso e áreas como infraestrutura (destaque para a modernização do setor elétrico e para a criação de novos mecanismos de financiamento), mercado de carbono, legislação trabalhista e previdenciária, inovação (aperfeiçoamento do Marco Legal das Startups), recuperação judicial de empresas, incentivos fiscais e desenvolvimento regional.

Revista – Com relação às medidas adotadas pelo governo durante a pandemia, quais foram os principais avanços e o que falta?

 RA – A atual legislatura, tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado, vem trabalhando com coragem, sempre em negociação com o governo federal, para levar adiante as medidas e as reformas necessárias ao desenvolvimento, retirando os entraves que prejudicam a atividade econômica. Foi rápida a aprovação, por exemplo, das ações urgentes para o país enfrentar as ondas da pandemia da covid-19, além de medidas essenciais para incentivar os investimentos produtivos e a retomada da economia.

Não podemos esquecer a importante reforma da Previdência Social, que diminuiu disparidades e sinalizou com a melhora das contas públicas a médio e longo prazo.  Além disso, medidas na área trabalhista durante a pandemia foram essenciais para evitar o fechamento de milhares de postos de trabalho.

No entanto, o desempenho da indústria está muito aquém da nossa capacidade, é resultado de um antigo conjunto de ineficiências estruturais, agravado pelos inesperados problemas trazidos pelo novo coronavírus. Entre os obstáculos recentes à reativação da economia está a desorganização das cadeias globais de produção e de transporte, que vem provocando a escassez de matérias-primas e insumos e, consequentemente, elevando os preços dos produtos industriais em todo o mundo.

No Brasil, a aceleração da inflação levou a um novo ciclo de aumento dos juros, o que desestimula o consumo e os investimentos. Além disso, a queda na renda da população, o desemprego e o endividamento das famílias continuarão afetando a atividade econômica no próximo ano.

Há um entrave que tem prejudicado o crescimento do país há muitos anos. É o Custo Brasil, que reduz a capacidade das nossas empresas de enfrentar em igualdade de condições os principais competidores internacionais. Com isso, a indústria nacional vem perdendo espaços importantes nos mercados interno e externo e na produção mundial de manufaturados. Atacar o custo Brasil é uma tarefa que requer, em primeiro lugar, a simplificação e a correção das distorções do sistema de arrecadação de impostos

Revista – O setor de construção civil conseguiu continuar em alta mesmo durante a pior fase da pandemia do Covid-19. A que o senhor atribui esse desempenho?

 RA – A indústria da construção cresceu a um ritmo constante em 2021, tendo apresentado bom desempenho no primeiro e segundo trimestres do ano passado. As vendas de materiais de construção, mensuradas na pesquisa mensal de comércio, do IBGE, permanecem elevadas em relação à situação de antes da pandemia, apesar da queda nos últimos dois meses.

Além disso, a produção de insumos típicos da construção civil segue com trajetória positiva. A produção média de julho a janeiro de 2021 se encontra 21,3% acima da realizada no mesmo período de 2020 e 10,8% superior à realizada no mesmo período de 2019, antes da pandemia.

Segundo a Sondagem Indústria da Construção, as expectativas dos empresários do setor também seguem positivas, o otimismo na indústria da construção recuou em março, mas segue elevado. Apesar do recuo, todos os indicadores de expectativas seguem historicamente elevados. A intenção de investimento para os próximos seis meses registrou o maior valor para o período desde 2014. A tendência de alta da intenção a investir acompanha a evolução da Utilização da Capacidade Operacional (UCO) que, embora tenha apresentado estabilidade entre janeiro e fevereiro, encontra-se em nível historicamente elevado.

A indústria da construção, juntamente com a agropecuária, tem sido uma das fontes de demanda por máquinas e equipamentos, impulsionando o crescimento dos bens de capital da indústria de transformação. Seguindo o bom desempenho do setor, a projeção de crescimento da Construção para 2022 é ainda mais positiva.

Revista – Apesar de uma leve alta no PIB e no IBC-Br, analistas acreditam que a economia deve continuar parada ao longo de 2022. O que precisa ser feito para mudar essa situação?

 RA – É preciso tomar uma decisão que terá forte impacto sobre o Custo Brasil. O sistema de tributação brasileiro sobre o consumo é complexo, regressivo e ineficiente. Essa é a percepção que ampara os debates sobre a reforma tributária no país. Apesar dos conflitos distributivos envolvidos no processo, é consensual que o Brasil só tem a ganhar com uma ampla revisão que resulte em melhores condições de competitividade para as empresas e em maior geração de emprego e renda para a população.

O Brasil tem uma das maiores cargas tributárias do mundo, possui riquezas, mas ainda lida com descompassos na aplicação de recursos da sociedade, gastando mal aquilo que arrecada. O aumento dos juros, do gasto público, da inflação, das matérias-primas e bens de consumo e a alta carga tributária impactam a competitividade das empresas e diminuem o poder de compra da população.

Para que haja investimento é necessário um cenário de segurança jurídica, estabilidade econômica, ambiente favorável aos negócios, sistema de transporte e infraestrutura adequados, mão de obra qualificada, crédito produtivo e de consumo, com menos burocracia. Lutamos há anos por uma reforma no sistema tributário e cada vez mais percebemos a necessidade de mudanças para que o Brasil melhore suas condições socioeconômicas.

A sociedade deve participar efetivamente nesse processo, se inteirar, posicionar e manifestar em prol da consolidação de um país que atenda às necessidades de quem produz e de quem consome.

Revista – O senhor declarou em entrevista dada em 2020, que o padrão de consumo estava mudando e que isso impactaria nos setores industriais. Quais mudanças são necessárias por parte das indústrias para atender a esses novos consumidores?

 RA – A mudança mais importante é aumentar os investimentos em inovação. A era da digitalização, da tecnologia da informação e das telecomunicações proporcionou o desenvolvimento de computadores pessoais, instrumentos de controle digitais, softwares e circuitos integrados, em uma  enorme gama de produtos e serviços inovadores. Vivemos a transição para uma nova revolução tecnológica, que nasce da nanotecnologia, da biotecnologia, da computação quântica e da inteligência artificial, em que há possibilidade de convergência dos mundos físico, digital e biológico, tornando o custo das coisas mais acessível e abrindo novas oportunidades de desenvolvimento econômico e social. Aí está a ignição para a Quinta Revolução Tecnológica.

Apesar do crescimento maciço dos investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e do aumento dos registros de propriedade intelectual, no Brasil, infelizmente, a última década foi insignificante em termos de crescimento econômico e da redução de desigualdades sociais, bem como da incorporação de ações inovativas, principalmente nas pequenas e médias empresas.

A ciência está viabilizando grandes transformações em todos os setores da indústria – não apenas na área de tecnologia de informação e comunicação (TIC) – no mesmo nível ou em patamar superior ao das mudanças anteriores, o que tem impulsionado a produtividade das empresas.

O Brasil tem potencial para se tornar líder mundial em diversos setores, tais como novos materiais verdes e alimentos, incluindo bens de capital, insumos e serviços correspondentes, ao mesmo tempo em que continua a atender os mercados doméstico e mais próximos com bens de consumo. Para isso, entretanto, é preciso que haja um processo inovativo contínuo, uma vez que, além de mudar o que e como se produz, as revoluções tecnológicas transformam a natureza dos mercados, assim como o tipo de organização das empresas e suas relações.

A transição está no limiar de duas revoluções, a atual e a futura. A busca pela substituição da energia fóssil para a renovável e a redução radical de lixo e do uso de materiais e de energia apontam nessa direção. Mais do que nunca há necessidade, também, de se acelerar a digitalização das empresas industriais, principalmente as de médio e pequeno porte. A preservação das florestas, em especial a amazônica, é igualmente importante, pois cria a possibilidade de surgimento de novos negócios para a região e para o país, sobretudo na área de bioeconomia.

Ressalte-se que as nações que conseguiram dar um salto de desenvolvimento tiveram o Estado como indutor dessa transformação. A ideia de um mercado livre sem políticas públicas eficientes não existe em nenhum país.  Também não há nenhum caso em que se conseguiu avançar no campo da inovação sem uma forte aliança entre o Estado, a indústria e a academia. Outros fatores cruciais são a adequação de políticas públicas e seus instrumentos, o aumento de investimentos em P&D, a formação e o treinamento das pessoas, a melhoria da qualidade da educação em todos os níveis e a capacidade do setor privado de aproveitar as oportunidades criadas.

Carlos Cruz é jornalista na Anicer.

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